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Comissão demarcatória de limites

Escrito por Super User | Publicado: Quinta, 21 de Junho de 2018, 17h23 | Última atualização em Sexta, 20 de Agosto de 2021, 13h51

Suplemento do Tratado de Madri sobre a instrução real para nomeação de comissários responsáveis pela demarcação dos territórios ibéricos na América. Pretendia-se, com esta demarcação, estabelecer a fronteira luso-castelhana com uma maior precisão para evitar disputas posteriores. Este documento expressa a preocupação das coroas ibéricas com uma demarcação clara de suas fronteiras e soberanias no Novo Mundo, estabelecida através da ação diplomática dos tratados, em uma tentativa de fazer cessar definitivamente as hostilidades. 

 

Conjunto documental: capitanias do Pará, Minas Gerais e Colônia do Sacramento
Notação: caixa 747, pct.03
Data-limite: 1703-1772
Título do fundo: vice-reinado
Código do fundo: d9
Argumento de pesquisa: limites
Data do documento: 17 de janeiro de 1751
Local: Madri
Folha: -

 

"Em nome da Santíssima Trindade

Os sereníssimos reis de Portugal[1] e Espanha[2] tendo concluído felizmente o Tratado de Limites[3] dos seus domínios na América assinado em Madri a 13 de janeiro do ano de 1750, e ratificado em forma, e desejando que se estabeleça a fronteira com a maior individualidade, e precisão, de sorte que no tempo adiante não haja lugar nem motivo para a mais leve disputa, concordaram pelo artigo XXII do dito tratado, que se nomeassem comissários por ambas as partes, para que ajustem com a maior clareza as paragens por onde há de correr a raia, e demarcação; segundo, e conforme se expressa no referido tratado, e artigo, e depois reconhecendo a demasiada extensão do terreno que se há de reconhecer, e demarcar, se conformarão em que vão duas tropas de comissários, uns pelo rio Maranhão, ou Amazonas[4], e outros pelo rio da Prata[5]; aos quais tem outorgado os poderes, que se porão no fim desta instrução, nomeando cada um pela sua parte pessoas de confiança, inteligência e zelo, para que concorrendo com os da outra, estabeleçam os limites na forma ajustada. E querendo que se execute com a união, e boa fé correspondente à sinceridade da suas intenções, resolverão instruir aos referidos comissários, do que hão de executar na prática dos casos, que se podem prevenir, dando-lhes também regra, e norma para que eles por si decidam os que não estejam prevenidos, a cujo efeito nós abaixo assinados ministros de suas majestades Fidelíssima e Católica usando dos plenos poderes que nos tem conferido para o tratado principal, sua execução e complemento, bem instruídos das intenções dos sereníssimos reis nossos amos, temos concordado nos presentes artigos que os comissários das duas coroas, que hão de ir pelo rio da Prata observarão em tudo, e por tudo. Em fé do que, em virtude das ordens e poderes que temos dos reis nossos amos, firmamos a presente instrução e assinamos com o zelo de nossas armas. Madri, 17 de janeiro de 1751.Visconde Tomás da Silva Teles[6]. José de Carvajal e Lancaster[7].

 

Segue-se o suplemento, e depois dele as ratificações dos dois respectivos monarcas."

 

 

[1] JOÃO V, D. (1689-1750): conhecido como “o Magnânimo”, d. João V foi proclamado rei em 1706 e teve que administrar as consequências produzidas na colônia americana pelo envolvimento de Portugal na Guerra de Sucessão Espanhola (1702-1712), a perda da Colônia do Sacramento e a invasão de corsários franceses ao Rio de Janeiro (1710-11). Se as atividades corsárias representavam um contratempo relativamente comum à época e nas quais se envolviam diversas nações europeias, a ocupação na região do Rio da Prata seria alvo de guerras e contendas diplomáticas entre os dois países ibéricos durante, pelo menos, um século, já que as colônias herdariam tais questões fronteiriças depois da sua independência. As guerras dos Emboabas (1707-09) na região mineradora e dos Mascates (1710-11) em Pernambuco completaram o quadro de agitação desse período. Entre as medidas políticas mais expressivas de seu governo, encontram-se: os tratados de Utrecht (1713 e 1715), selando a paz com a França e a Espanha respectivamente, e o tratado de Madri (1750), que objetivava a demarcação dos territórios lusos e castelhanos na América, intermediado pelo diplomata Alexandre de Gusmão. Este tratado daria à colônia portuguesa na América uma feição mais próxima do que atualmente é o Brasil. Foi durante seu governo que se deu o início da exploração do ouro, enriquecendo Portugal e dinamizando a economia colonial. O fluxo do precioso metal contribuiu para o fausto que marcou seu reinado, notadamente no que dizia respeito às obras religiosas, embora parte dessa riqueza servisse também para pagamentos de dívidas, em especial com a Inglaterra. Mesmo assim, as atividades relacionadas às artes receberam grande incentivo, incluindo-se aí a construção de elaborados edifícios (Biblioteca de Coimbra, Palácio de Mafra, Capela de São João Batista – erguida em Roma com financiamento luso e, posteriormente, remontada em Lisboa) e o desenvolvimento do peculiar estilo barroco, que marcou a ourivesaria, a arquitetura, pintura e esculturas do período tanto em Portugal quanto no Brasil. Seu reinado antecipa a penetração das ideias ilustradas no reino, com a fundação de academias com apoio régio, a reunião de ilustrados, a influência da Congregação do Oratório, em contrapartida à Companhia de Jesus.

[2] FERNANDO VI (1713-1759): governou a Espanha entre os anos de 1746 e 1759, sendo adepto de uma política pacifista e de neutralidade. Teve como seus principais colaboradores os fidalgos José de Carvajal y Lancaster e o marquês de Ensenada. Em 1729, casou-se com Bárbara de Bragança, filha de d. João V, rei de Portugal. Sob seu governo, foi assinado o Tratado de Madri com a corte portuguesa em 1750 e firmado o tratado regalista de 1753, que possibilitou o controle sobre a Igreja, atribuindo ao rei o patronato universal. No campo das artes, destacou-se pela fundação da Academia de São Fernando de Belas Artes em 1752. Foi sucedido no trono por seu irmão Carlos III.

[3] TRATADO DE MADRI (1750): acordo de limites firmado entre Portugal e Espanha em 1750, visando reconhecer oficialmente as fronteiras marítimas e terrestres, definindo os limites do poderio de cada coroa sobre as colônias na América. Nesse contexto, merece destaque a figura de Alexandre de Gusmão, secretário do Conselho Ultramarino, brasileiro que intermediou o tratado e conferiu a este o princípio do uti possidetis, isto é, a ideia de que a terra deveria pertencer a quem de fato a ocupasse. Essa iniciativa constituiu uma inovação jurídica no domínio das negociações diplomáticas. Gusmão também foi o responsável pela elaboração do Mapa dos Confins do Brazil com as terras da Coroa de Espanha na América Meridional, conhecido como mapa das Cortes, que buscou ilustrar o estipulado no texto do projeto de tratado proposto, uma construção cartográfica com objetivos diplomáticos. No mapa apareciam as terras em disputa que já estariam efetivamente ocupadas pelos súditos portugueses na América e foi fundamental para o aceite espanhol de quase todas as cláusulas que vieram de Lisboa. Em suas determinações, o tratado estabelecia que a colônia do Sacramento pertenceria à Espanha e o território dos Sete Povos das Missões a Portugal. Ao Norte, no vale Amazônico, também foram atendidos os interesses portugueses, garantindo a defesa daquele território diante da possibilidade de investidas de estrangeiros na região e consolidando o controle político-administrativo do estado do Grão-Pará e Maranhão; além de garantir a integração dessa região com a capitania de Mato Grosso, mantendo o controle dos rios existentes no vale do Guaporé. Pela primeira vez, desde o Tratado de Tordesilhas (1494), procurava-se definir a totalidade dos limites entre as possessões das coroas ibéricas no novo mundo. Este tratado acabou por fornecer à América portuguesa uma configuração muito próxima à atual delimitação territorial do Brasil. A demarcação de tais fronteiras, demasiado extensas, não foi um processo simples: após a assinatura do tratado, as coroas ibéricas organizaram expedições demarcatórias constituídas por diversos profissionais formados nas áreas de engenharia, cartografia, matemática, desenho, astronomia, entre outros, com o objetivo de reconhecer, cartografar e delimitar as fronteiras do território colonial. No entanto, um clima de desconfiança entre os participantes das comissões de demarcação ameaçava a conclusão dos trabalhos, além das dificuldades em retirar os jesuítas e índios da região dos Sete Povos e outros problemas encontrados na demarcação territorial, explicam a pouca duração desse tratado, anulado, em 1761, pelo Tratado de El Prado. Cabe ressaltar que o Tratado de Madri desempenhou um papel de extrema importância na formação territorial do Brasil pois expôs as reais proporções da ocupação portuguesa na América, resultado da expansão territorial para além do tratado de Tordesilhas durante mais de dois séculos de colonização.

[4] RIO AMAZONAS: Maranhão foi o primeiro nome dado ao rio Amazonas e à região por ele banhada. Recebeu a denominação de Amazonas, por existirem na região mulheres que combatiam lado a lado com os homens para expulsar os invasores. Por ser uma das principais vias de acesso ao interior do Brasil, o rio Amazonas era fonte de preocupação para a administração colonial, temerosa da ação de corsários e piratas. Entre as medidas adotadas pelo poder colonial para impedir a entrada de corsários na América portuguesa pelo rio Amazonas, esteve a criação do Forte do Presépio em 1616, o qual mais tarde deu origem a cidade de Belém.

[5] PRATA, RIO DA: descoberto pelo navegador espanhol João Dias de Solis em 1515, na busca por uma comunicação entre o oceano Atlântico e o Pacífico. O rio, como também seu estuário – na região da tríplice fronteira entre os atuais países Brasil, Uruguai e Argentina – recebeu o nome de Prata por inspiração de Sebastião Caboto, navegador italiano a serviço da Coroa espanhola, impressionado pela abundância deste metal na localidade. A região do rio da Prata foi alvo, durante o período de dominação colonial ibérica nas Américas, de intensas disputas entre as duas metrópoles (Portugal e Espanha), em função de sua importância econômica – jazidas de prata – e estratégica – principal via de acesso ao interior da América. Uma das consequências dessas intensas disputas pela região foi a quase ausência de uma ocupação política efetiva, já que se alternavam invasões de um lado ou de outro do rio – nas províncias de São Pedro do Rio Grande e na Colônia do Sacramento – que mais se assemelhavam a incursões de pilhagem do que tentativas de estabelecimento de domínio de autoridade. A fundação de Sacramento por Portugal em 1680 representou uma iniciativa para apoiar a ampliação dos limites do império até o rio da Prata. No entanto, a região foi palco de inúmeros processos de ocupação e, até sua independência política em 1825, fez parte de diferentes nações ou confederação de estados. O Tratado de Madrid não conseguiu solucionar as questões em torno da região e os portugueses continuaram a insistir na ideia de uma “fronteira natural, ” que os levaria até o lado esquerdo do estuário. Interesses da coroa britânica na região agiam como fator complicador nos litígios entre Portugal e Espanha, interesses estes registrados e documentados desde o século XVIII em função de atividades mercantis daquela que era, à época, a nação que mais produzia e comercializava produtos manufaturados. A participação da Inglaterra na concepção do projeto de transmigração da corte portuguesa para o Brasil integrava as tentativas de estender a influência inglesa a outras regiões da América do Sul, embora tal atuação não significasse o apoio à ideia de formação de um bloco coeso na região, supostamente sob influência de Portugal. A Inglaterra fez dura oposição ao projeto de anexação da região cisplatina ao Reino do Brasil, projeto levado a cabo por d. João VI em 1821, e apoiou o movimento de independência do atual Uruguai, interessada na liberação e fragmentação completa das colônias espanholas.

[6] TELLES, TOMÁS DA SILVA (1683-1762): era filho do marquês de Alegrete, Fernando da Silva Teles, e de d. Helena de Noronha. Tendo freqüentado a Universidade de Coimbra, Silva Teles iniciou a carreira militar em 1708, participando das lutas contra as tropas de Filipe V, na Guerra de Sucessão Espanhola (1703-1713). Recebeu os títulos de visconde de Vila Nova da Cerveira ao casar-se com a sua sobrinha d. Maria José de Lima e Hohenloe e de gentil-homem da câmara de d José I em 1750. Foi ainda embaixador extraordinário em Madri e conselheiro de Guerra. Vila Nova esteve entre os fidalgos que fizeram oposição ao marquês de Pombal, sendo preso no castelo de S. João da Foz onde permaneceu até o seu falecimento. Sob o pseudônimo de Teotônio de Souza Tavares, publicou o Discurso sobre a disciplina militar, a ciência de um soldado de infantaria, dedicado aos soldados novos em 1737.

[7] LANCASTER, JOSÉ DE CARVAJAL Y (1698-1754): político espanhol e membro da ilustre família inglesa dos Lancaster. Ocupou importantes cargos no Conselho das Índias durante o reinado de Felipe V. A partir de 1746, como secretário de Estado, Carvajal passou a controlar as relações exteriores da Espanha. Favorável a uma solução das questões limítrofes entre o império português e espanhol na América dirigiu as negociações do Tratado de Madri, assinado em 1750. Foi um dos fundadores da Academia de Belas Artes e da Real Academia Espanhola.

Sugestões de uso em sala de aula

- No eixo temático "História das representações e das relações de poder"
- No sub-tema "Nações, povos, lutas, guerras e revoluções"

Ao tratar dos seguintes temas
- Estados modernos: política e diplomacia (tratados) no período colonial
- A expansão territorial e as fronteiras do Brasil
- América: os conflitos luso-castelhanos

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