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Alimentação na américa Portuguesa

Mapa das importações da capitania do Maranhão

Publicado: Terça, 06 de Fevereiro de 2018, 19h15 | Última atualização em Sexta, 30 de Abril de 2021, 18h20

Mapa dos produtos alimentares – aguardente, azeite, cerveja, manteiga etc. – importados dos domínios portugueses, de Lisboa, do Porto e da Inglaterra pela capitania do Maranhão, no ano de 1813, elaborado por João José Moraeslio, administrador da alfândega.

 

Conjunto documental: Ministério do Reino. Maranhão. Correspondência do presidente da província
Notação: IJJ9 129
Datas-limite: 1788-1816
Título do fundo: Série Interior
Código do fundo: AA
Argumento de pesquisa: Portugal, azeite
Data do documento: 1813
Local: Maranhão
Folha(s): 245

 

Mapa ou relação das diversas mercadorias, gêneros e artigos importados dos domínios portugueses e de diferentes reinos estrangeiros nesta capitania do Maranhão[1] no ano de 1813 conforme os despachos feitos na respectiva alfândega.

Da Costa do Brasil até o Rio Grande do Sul

Produtos

Quantidades

Peso / Medida

Preço

Importância

Aguardente[2] Cachaça do Pará

263 pipas

14 barris

70#000

18:578#000

Açúcar[3]

181 caixas
14 faixo

11702@
327 barricas

2#000

20:501#550

Carne Seca[4]

480 peças

16.496 ditas

1500

24:744#000

Chocolate[5]

"

6 arrobas

6400

38#400

Cocos de comer

18.093

"

30

542#790

Ditos de beber água

200

"

30

6#000

Guaraná do Pará[6]

"

32 arrobas

25#600

824#800

Peixe Seco e Salgado

"

4100@

1200

4:920#000

Toucinho[7]

"

423@

3#200

1:353#000

Lisboa

Produtos

Quantidades

Peso / Medida

Preço

Importância

Azeite doce[8]

31 1/2 pipas

"

180.000

5.670#000

Bacalhau[9]

274 barricas

249 ditos

8000

1:994#000

Bolacha e Biscoito

3302 barris

138099@

1600

22:086#000

Marmelada em Bocetas e caixas

"

159 ditas

9600

1.531#000

Massas aletria e macarrão

116 volumes

212 arrobas

3200

678#400

Presuntos

"

149 @ 25 alt

9000

1:348#031

Vinho[10]

600 ditos e 6 ditos

"

100.000

60:020#000

Porto

Produtos

Quantidades

Peso / Medida

Preço

Importância

Azeitona

457 ancoretas

"

1200

548#400

Farinha do Norte

1135 barricas

6537@

200

1:374#000

Figo

"

77@

3200

246#400

Vinagre

3 pipas e 3 almoedas

"

50.000

155#000

Vinho

452 pipas

"

110:000

5:005#000

Inglaterra

Produtos

Quantidades

Peso / Medida

Preço

Importância

Farinha de Trigo

219 barricas

234993 @

8000

1:878#000

Manteiga[11]

2109 barris

120.368

240

28:888#320

Queijos londrinos e de pinha

672

212@26

6400

1:362#000

Garrafas de Cerveja[12]

1654 dúzias

"

2000

3:290#000

Vinagre

1 pipa

26 almoedes

1700

2:874#700

O Administrador da Alfândega
João José Moraeslio"

 

[1] MARANHÃO: os primeiros europeus a chegarem à região onde hoje se encontra o estado do Maranhão foram os espanhóis em 1500. A capitania originou-se a partir do sistema de capitanias hereditárias implantado por d. João III em 1534 e sua colonização coube ao tesoureiro e cronista português, João de Barros. No entanto, foram os franceses que realizaram a ocupação efetiva do território, iniciada em 1612, quando 500 deles, comandados por Daniel de la Touche, senhor de La Ravardière, chegaram em três navios e fundaram a França Equinocial diante das tentativas fracassadas de Portugal. Os franceses construíram na região o forte e vila de São Luís, batizados com este nome em homenagem ao seu rei Luís XIII, originando a cidade que se tornaria a capital do Maranhão. Seguiram-se lutas e tréguas entre portugueses e franceses até 1615, quando os primeiros retomaram definitivamente a colônia. Assim, em 1621, foi instituído o estado do Maranhão e Grão-Pará, com o objetivo de proteger a costa e facilitar os contatos diretamente com a metrópole, uma vez que as relações com a capital da colônia eram difíceis. Em 1641, os holandeses invadiram a região e ocuparam a ilha de São Luís. Três anos depois, foram expulsos pelos portugueses. Durante o século XVII, o Maranhão mostrou-se uma região relativamente lucrativa para o comércio internacional, dada a presença das chamadas drogas do sertão e de alguns produtos agrícolas, bastante valorizados para fins de exportação. Em 1751, devido ao florescimento econômico impulsionado pela produção de açúcar, algodão, tabaco e das drogas do sertão (sobretudo na capitania do Pará), o nome do Estado mudou para Grão-Pará e Maranhão, e intensificaram-se as disputas pela exploração e comércio, sobretudo das drogas, que culminaram na expulsão dos jesuítas, que controlavam estas atividades, em 1759. Em 1772, o Estado foi desmembrado em duas capitanias gerais e duas subalternas, Pará e Rio Negro, e Maranhão e Piauí. É importante ressaltar ainda que, embora Portugal visse seus estados na América como um conjunto, como uma grande colônia, esta visão não era compartilhada pelos colonos que moravam aqui, que não viam este todo, o Brasil, e não percebiam unidade na colônia. Dessa forma, a forte influência portuguesa no Maranhão fez com que o estado apoiasse a metrópole contra a independência do Brasil, e só viesse a aceitá-la após intervenção armada em 1823.

[2] AGUARDENTE: bebida derivada da fermentação e destilação do caldo ou do melaço da cana-de-açúcar, conhecida também como jeribita, táfia, cachaça, vinho de mel, ou ainda garapa azeda. Foi introduzida no Brasil pelos primeiros colonizadores portugueses, surgindo como subproduto dos engenhos de açúcar. Destinada inicialmente ao consumo local, ficou conhecida por muito tempo como bebida de escravo. Entretanto, pelo altíssimo teor alcoólico e baixo preço em relação ao vinho português, sua venda disseminou-se não só na América, como também em outras colônias portuguesas, de maneira que, no século XVII, já era utilizada como moeda de troca na compra de escravos na costa africana. A concorrência com a produção das Antilhas no Seiscentos fez despencar o preço do açúcar brasileiro no mercado internacional, forçando a procura por outros gêneros com características semelhantes. Foi nessa conjuntura que a aguardente ganhou espaço, sendo considerada como produto compensador da economia açucareira. Mesmo nas fases favoráveis, o açúcar possuía uma grande desvantagem em relação à aguardente: a baixa lucratividade para os seus produtores. Sendo um derivado da cana-de-açúcar, a aguardente era a grande responsável pelos ganhos dos engenhos brasílicos (25%), pois não estava atrelada ao dízimo e não era mercadoria dividida com os lavradores de cana. Devido à alta lucratividade dada aos senhores de engenho na colônia e ao temor da concorrência com o vinho português, a Coroa passou a tributar o produto e proibir sua comercialização. Apesar disso, as engenhocas, que oficialmente fabricavam rapadura, e os alambiques continuaram a produzir aguardente, o que contribuiu para disseminar a expressão a “salvação da lavoura”. Baixo custeio da produção e alta lucratividade fizeram da bebida, tipicamente tropical, o recurso acionado em momentos de dificuldades.

[3] AÇÚCAR: produto extraído principalmente da cana-de-açúcar e da beterraba, também chamado sacarose, constituiu uma das fontes de financiamento da expansão portuguesa. Originária da Nova Guiné, a cana sacarina foi trazida pelos árabes que a introduziram no norte da África e na Europa mediterrânea. Por muito tempo foi uma especiaria rara e de propriedades medicinais, além de seu emprego como tempero nas conservas e doces. Em Portugal, a cultura da cana existiu desde o século XIV no Algarves e na região de Coimbra, passando para a ilha da Madeira na costa africana, em meados do século seguinte, até ser bem-sucedido nas ilhas de São Tomé e Príncipe na primeira metade do século XVI. Não há precisão quanto à data de introdução da cana-de-açúcar no Brasil, embora se assinale sua presença na capitania de Pernambuco nas primeiras décadas do Seiscentos. Já o início da maior sistematização de seu plantio teria se dado a partir da segunda metade do século XVI. A fabricação do açúcar exigia alguns requisitos: por um lado, a instalação de um engenho demandava capitais consideráveis, por outro, requeria trabalhadores especializados. Exceto por esses trabalhadores, livres e assalariados, a mão de obra dos engenhos era predominantemente escrava. De início, recorreu-se aos indígenas, mas, após 1570, os africanos tornaram-se cada vez mais comuns. O comércio da escravatura converteu-se em um lucrativo negócio nessa época. O cultivo da cana-de-açúcar progrediu ao longo do litoral brasileiro na direção norte, se desenvolvendo mais no Nordeste, especialmente nas capitanias da Bahia e de Pernambuco, sendo esta última a maior produtora de açúcar do Brasil, com 66 engenhos no fim do Quinhentos. Nesse período, a maior parte do açúcar brasileiro destinava-se ao mercado internacional, chegando a portos do norte da Europa, especialmente Londres, Hamburgo, Antuérpia e Amsterdã, onde eram refinados e comercializados. A cultura da cana-de-açúcar foi também muito importante, para o mercado interno. Muitos engenhos aproveitavam o açúcar para a produção da aguardente que, consumida localmente, dava grandes lucros aos seus senhores chegando a ter sua comercialização proibida pela Coroa. A fabricação de açúcar foi, seguramente, o primeiro empreendimento econômico a funcionar de modo organizado nas terras brasileiras. Outras atividades surgiram, mas a empresa açucareira se manteve na liderança por mais de um século.

[4]  CARNE-SECA: também denominada jabá, carne de sol, carne do sertão ou carne do Ceará consiste na carne bovina cortada em mantas (grandes pedaços), salgada e seca ao sol. A pecuária do interior nordestino, nos primeiros séculos da colonização, serviu também para abastecer o mercado alimentício interno, produzindo um tipo de carne em conserva, a carne-seca, destinada aos escravos da grande lavoura de açúcar do litoral. No entanto, sua produção não resistiu ao flagelo das secas que assolaram a região durante os séculos XVII, XVIII e XIX. No século XVIII, surgiu então a produção de carne-seca no Rio Grande do Sul que se beneficiou da abundância de carne bovina na região. A carne-seca do sul resistia mais de um ano sem estragar. Continha mais sal, com secagem mais intensa ao sol e ao vento e recebeu o nome de charque, nome de origem quíchua. Os charqueados gaúchos passaram então a escoar sua produção nos mercados consumidores, antes abastecidos pela produção nordestina: Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco. O charque gaúcho também foi exportado para Havana. No início do século XIX, no entanto, o produto sulino passou a sofrer a concorrência do charque platino, que aqui chegava por meio do contrabando da Banda oriental. A carne-seca foi um alimento de primeira necessidade no Brasil. Junto com o feijão e a farinha, a carne-seca, compunha o tripé alimentar da América portuguesa. A paçoca nordestina, por exemplo, feita com a carne-seca frita na gordura do porco, misturada à farinha de mandioca e socada no pilão de madeira até virar pó, foi largamente consumida pelos bandeirantes, viajantes e tropeiros em suas viagens, por ser um alimento que se conservava por muito tempo, sem se estragar.

[5] CHOCOLATE: fabricado pelos maias, foi levado para a Europa por frades dominicanos ainda em inícios do século XVI, e encontrou boa aceitação. Nas regiões hoje correspondentes aos territórios do México e da Guatemala, começou o cultivo do cacau, a fabricação e consumo do chocolate em forma líquida pelas populações maias e astecas, que o chamavam de cacahuatl. O primeiro uso da bebida na Europa, ainda no século XVI, era para fins medicinais. Em 1737, o cacaueiro foi classificado por Lineu e recebeu o nome científico de Theobroma cacao L., sendo o próprio naturalista um apreciador da bebida. Em fins do XVII, o consumo de chocolate, até então uma bebida fria, grossa, amarga e bastante gordurosa, receberia uma grande melhora e incentivo. A adição do açúcar, que se produzia em larga escala nas Américas, passou a adoçar a mistura e torná-la mais agradável ao paladar, além de receber água quente, o que promoveu um aumento no consumo e, consequentemente, na produção e comércio. O processo de preparação do chocolate envolvia a separação das sementes da polpa do cacau, a secagem e torração destas, a posterior separação das amêndoas das cascas, e a prensagem da massa, geralmente em forma de bolo, cilindro ou tijolo, ao qual se acrescentava água quente. O líquido costumava ser mexido constantemente para se obter espuma e era servido em pequenas cuias. Ainda no século XVII, o chocolate era a bebida das elites europeias e hispano-americanas. O quadro mudaria no Setecentos. O chocolate já era abundantemente produzido na Amazônia brasileira pelos jesuítas, que o consumiam bastante, e também lucravam muito com este comércio. Essa associação entre a bebida e os jesuítas acabou por ganhar ares negativos quando os padres da Companhia de Jesus foram expulsos do império português, e o chocolate passou a ser tratado como uma bebida decadente. Já no século XIX, o consumo e comércio do chocolate tomaram outro rumo. Na década de 1820, a modernização do processo de fabricação permitiu a produção em pó, com menos gordura e mais fácil de preparar e consumir. Em 1849, apareceu o primeiro chocolate sólido comestível e, desde então, o chocolate ficou mais barato, mais popular e espalhou-se pelo mundo, fazendo parte dos hábitos alimentares de pessoas em todos os continentes. A introdução do cacau na África promoveu o desenvolvimento de um chocolate de qualidade superior, sendo este continente atualmente o maior produtor mundial de cacau e chocolate.

[6] GUARANÁ DO PARÁ: planta originária da floresta amazônica, o guaraná (Paullinia cupana H.B.K.) foi posteriormente adaptado e cultivado nas demais regiões do país. Narrativas de viagens realizadas no Brasil do século XVIII já registravam a existência da bebida feita do guaraná, destacando seu efeito estimulante e refrescante, bem como suas qualidades fitoterápicas. Mas foi o botânico Carl Friedrich Philipp Von Martius (1794-1868) que descreveu em Viagens pelo Brasil (Amazonas, Pará, 1819) o preparo da bebida de guaraná realizado pelos índios Sateré-Maué, também chamados “povo do guaraná”, que foram os pioneiros na sua domesticação e cultivo. Os Sateré-Maué (Amazonas) tomavam o guaraná reduzido a um pó bastante fino acrescido de água. Só depois, o consumo da bebida se generalizou, passando a fazer parte da dieta alimentar das demais tribos indígenas e dos colonos do Pará, que ralavam o pão de guaraná usando o osso do pirarucu (hióide). O guaraná é um cipó lenhoso (trepadeira) que cresce sobre as árvores, podendo atingir até dez metros de altura. Cultivado possui porte de arbusto em forma de moita, com apenas três metros. As flores são brancas, ou amarelas claras, e os frutos se aglomeram em cachos compridos que, maduros, possuem cor avermelhada e se apresentam entreabertos, exibindo sementes negras. As sementes maduras do guaraná são torradas e moídas, formando uma massa moldável e homogênea de cor cinzenta que, depois da defumação para secagem, escurece com o tempo, devido à oxidação. A partir dessa massa, se produzem os “pães” de forma cilíndrica, elíptica ou oval de consistência duríssima que precisam ser limados para consumo. Pesquisas médicas divulgaram as propriedades medicinais do fruto amazônico: antitérmico, antineurálgico, antidiarréico, estimulante, analgésico e antigripal. O guaraná é hoje comercializado em quatro formas: em rama, em pó, em xaropes e essências para refrigerantes, e o Brasil é praticamente o único produtor do mundo seguido por uma pequena produção comercial realizada na Venezuela e no Peru.

[7] TOUCINHO: gordura localizada abaixo da pele do porco, com o respectivo couro. A criação de suínos e a produção de toucinho destinavam-se ao consumo familiar e ao abastecimento dos mercados locais. O toucinho era o mais importante subproduto da criação de suínos. Alimento utilizado no preparo de todas as comidas, servia para cozinhar, untar e preservar os alimentos. Foi utilizado também para substituir a manteiga e o azeite. Separado da carne, o toucinho podia ser conservado por meio da salga, depois encaixotado e comercializado. A carne também podia ser salgada para a venda. Indispensável na dieta alimentar dos habitantes da colônia, o toucinho integrava obrigatoriamente o farnel de bandeirantes, tropeiros e viajantes, principalmente na sua versão salgada. Os escravos e a população pobre consumiam diariamente, acompanhado de feijão-preto e farinha de mandioca.

[8] AZEITE: óleo extraído do fruto das oliveiras: a azeitona. Os povos mediterrâneos iniciaram o cultivo para a extração do azeite por volta de 3.000 a.C. e a expansão do Império Romano foi fundamental na dispersão dessa cultura. Em algumas regiões do litoral do Brasil, o azeite de oliva puro de origem portuguesa era chamado de azeite doce. Por ser um produto de importação, foi sempre objeto de impostos firmados por meio de contratos entre particulares e a metrópole. Em 1640, com o fim da união entre as Coroas ibéricas e a retomada de sua independência política, Portugal precisou reorganizar seu sistema de monopólios comerciais. Assim, criou em 1649 a Companhia Geral do Brasil concedendo-lhe o monopólio da venda (estanco) do azeite doce, do vinho, da farinha e do bacalhau que eram produtos importados de Portugal. Já a gordura extraída da baleia, também chamada azeite de peixe, processada e transformada em óleo, foi utilizada até o século XIX na iluminação de ruas e residências e na fabricação de sabão. [Ver também PESCA DE BALEIAS].

[9] BACALHAU: durante séculos, o autêntico bacalhau era o Gadus morhua L, cujos cardumes eram abundantes nas águas geladas do Atlântico Norte. Os povos noruegueses, dinamarqueses e suecos (vikings) foram os pioneiros na pesca do Gadus morhua conservando-o seco, ao ar livre, para ser consumido aos pedaços, bastante endurecidos durante as longas viagens marítimas que realizavam. A comercialização do bacalhau em larga escala, iniciada por volta do ano 1000, pelos bascos só foi possível graças ao conhecimento que possuíam da técnica de conservação de salga e secagem. Foi na Espanha, no século XVI, que surgiu o termo “bacalao” para designar o peixe Gadus morhua. Chegou ao Brasil trazido pelos portugueses, que o consumiam durante a travessia marítima. No início do século XIX, com a chegada da corte portuguesa, seu consumo se difundiu entre os brasileiros. Alimento barato, incorporou-se facilmente à dieta alimentar local, principalmente nos dias santos, feriados e às sextas-feiras. Em 1843, ocorreu a primeira exportação oficial de bacalhau da Noruega para o Brasil. Vários outros peixes de qualidade inferior passaram a ser assim chamados, vendidos salgados e curados.

[10] VINHO: bebida alcoólica resultante da fermentação do sumo das uvas (mosto), que contém grande concentração natural de açúcares, em contato com leveduras existentes na casca do fruto. O primeiro registro sobre a existência de um vinhedo cultivado data do ano 7.000 a.C. e se situava na região da Europa oriental e costa do mar Negro. Mais tarde, o plantio da vinha chegou ao Egito, à Grécia e a outras partes da Europa. A utilização do vinho nos sacramentos cristãos garantiu a sobrevivência da viticultura no período medieval: foi em torno das catedrais e dos mosteiros que os monges a aperfeiçoaram, a partir do emprego de castas de uvas especiais e da melhoria das técnicas, o que resultou num produto de melhor qualidade, permitindo sua comercialização no final desse período. Portugal possuía longa tradição vinícola; no século XVIII, já exportava quantidade significativa de vinho do porto e madeira para o mercado inglês. Nesse mesmo período, a produção vinícola das províncias do norte começava a se destacar, suplantando a produção do vinho fortificado, assemelhado ao do porto, produzido na ilha da Madeira. Para sua comercialização, os vinhos eram classificados segundo tipo e qualidade. Vinho de feitoria (oriundo de região demarcada), vinho de quintas (produzido e comercializado por vinicultores individuais), vinho de embarque (de qualidade adequada para exportação), vinho generoso (licoroso, com elevados teores de açúcar e fortificado com uma graduação alcoólica entre 14 a 18º servido, normalmente, como aperitivo) são algumas dessas classificações. No início da colonização, havia no Brasil uma produção significativa em São Paulo que foi proibida para não prejudicar o comércio de importação da portuguesa. O vinho era a bebida consumida pela elite colonial que o apreciava também devido às suas qualidades terapêuticas. Foi bastante considerável o volume de comércio de importação do vinho português para o Brasil. A Coroa portuguesa garantiu o mercado colonial para seu produto concedendo à Companhia de Comércio (1649) o monopólio da sua importação (estanco). Chegou mesmo a ser usado como moeda no início do tráfico de escravos, mas acabou substituído pelas aguardentes já no século XVII, produto mais barato, de maior durabilidade e aceitação na África.

[11] MANTEIGA: embora a palavra manteiga possa se referir a vários compostos de gordura e água, como a manteiga de amendoim, manteiga de jabuti – comum no interior do Brasil na época colonial – e manteiga de cacau, o termo sozinho designa o produto derivado do leite extraído da vaca. Surgida cerca de 3.000 anos antes de Cristo, era utilizada por gregos e romanos como unguento ou medicamento de uso externo. Ingrediente fundamental na culinária portuguesa, em especial nos doces e sobremesas, a manteiga durante muito tempo foi artigo raro no Brasil colônia, mesmo entre as elites. A manteiga consumida no Rio de Janeiro no início do século XIX ainda era rançosa, do tipo vermelha importada da Inglaterra e precisava ser lavada antes do consumo.

[12] CERVEJA: consumida desde a Antiguidade, embora desprezada pelos gregos e romanos em favor do vinho, a cerveja era obtida a partir de grãos como o centeio, a aveia, o trigo e a cevada – grão que logo se tornou o preferido. Em 1516, o duque Guilherme IV da Baviera instituiu a Lei da Pureza, um dos mais antigos códigos de alimentos da história, determinando que apenas a água, o malte, o lúpulo e a levedura fossem utilizados na fabricação da bebida. Se a expansão marítima fomentou o comércio de cerveja, paralelamente fez emergir competidores não alcoólicos como o café e o chocolate. No século XVII a concorrência do vinho e de bebidas destiladas também foi enfrentada principalmente pelos holandeses, então à frente do negócio cervejeiro. No século seguinte os ingleses iriam impor medidas protecionistas contra o vinho francês, tornando-se uma “nação bebedora de cerveja”, segundo Matheus da Costa Lavinscky (Revista Mosaico, v. 10, jan./dez. 2017, p. 173-182). O hábito do consumo da cerveja demorou a chegar ao Brasil, já que muitos portugueses produtores de vinho temiam a concorrência com essa bebida. Com a vinda da Corte portuguesa para o Brasil e a abertura dos portos em 1808, a cerveja, bem como outros produtos raramente tidos na colônia, passou a ser vendida e consumida por uma restrita parcela da população, tendo em vista que só existiam marcas importadas, principalmente inglesas. Passou a ser produzida no Brasil a partir da segunda metade do século XIX, por grupos imigrantes europeus.

 

 

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