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Valores pagos pelo contrato das baleias

Publicado: Sexta, 15 de Junho de 2018, 15h23 | Última atualização em Segunda, 16 de Agosto de 2021, 15h31

Provisão na qual o rei ordena que Francisco de Oliveira seja ressarcido no valor de 361.261 cruzados, porque o dito Francisco entregou essa quantia a mais no valor total do pagamento do contrato da pescaria de baleias de 1702 à 1705 porque havia perdido os documentos da sua conta na época da invasão francesa e não sabia, ao certo, quanto deveria ser pago.

 

Conjunto documental: Governadores do Rio de Janeiro
Notação: códice 77, vol. 24
Datas-limite: 1644 - 1719
Título do fundo: Secretaria de Estado do Brasil
Código do fundo: 86
Argumento de pesquisa: pesca, baleias
Data do documento: 16 de agosto de 1718
Local: Lisboa
Folha(s): 343-345

 

Eu o rei[1] faço saber que estão na minha provisão, mirem que tendo respeito ao que me representou por parte de Francisco de Oliveira em razão de que requerendo no Rio de Janeiro haver pagamento de 361,261 cruzados que entregou de mais a seu do que devia do contrato da pesca de baleias[2] de que foi contratador o terceiro que começou em 1° de Abril de 1702 e acabou no ultimo de Março de 1705 se lhe não deferia como pretexto de se dizer havendo perdido as papeis da sua conta, com a invasão dos franceses[3] naquela cidade, o que lhe não podia ser de obstáculo, pois este prejuízo não esteve pela sua parte da quanto mais que da sua quitação, a dita quantia que entregou de mais da arrematação da deste contrato[4], cujo documento só deveria guardar e se não passaria se não estava ajustado a sua conta. Pedindo-me lhe mandasse satisfazer a dita quantia, e atendendo ao que alega, e ao que sobre este requerimento respondeu o provedor[5] de minha fazenda a que se deu custa. Hei por bem e mais, dou ao meu governador da capitania do Rio de Janeiro[6], e ao provedor de minha fazenda dela se cumpram, digo nela façam pagar ao dito Francisco de Raicena os ditos 361.261 que entregou de mais do preço porque arrematou o dito contrato das baleias para que nenhum tempo se possa repetir este pagamento e se postam a acertar as necessárias nas partes onde convier e cumpram e guardem esta provisão e façam cumprir e guardar. Theotonio Pereira de Castro o fez em Lisboa a 16 de agosto de 1718.

 

[1]PEDRO II, D. (1648-1706): conhecido como “o Pacífico”, por ter estabelecido a paz com a Espanha em 1668, d. Pedro II era filho de d. João IV e de d. Luísa de Gusmão. Proclamou-se príncipe regente em 1668, alegando que seu irmão, Afonso VI, sofria de instabilidade mental e casou-se com sua cunhada no mesmo ano. Assumiu o trono após a morte do irmão em 1683. Sob seu reinado ocorreram a paz definitiva com a Espanha, pondo fim à Guerra de Restauração; a descoberta das primeiras jazidas de ouro no Brasil (1695) e a assinatura do tratado de Methuen com a Inglaterra (1703) de consequências econômicas nefastas, pois determinou um desequilíbrio crônico e negativo para Portugal, além de minar irremediavelmente a ainda incipiente produção manufatureira no reino ibérico. D. Pedro II dissolveu as cortes deliberativas em Portugal, governando com plenos poderes e representando a figura clássica do monarca absolutista. Ao final do seu reinado, acabaria por envolver-se novamente em um conflito armado com a Espanha, deixando de herança para seu filho, d. João V, um país com várias áreas ocupadas pelo exército inimigo.

[2]PESCA DE BALEIAS: os primeiros acordos firmados entre contratadores da pesca (ou caça) de baleias e a Coroa portuguesa ocorreram durante a União Ibérica (1580-1640). A atividade, cujos primeiros passos se deram ainda no início do século XVII, ganharia impulso na segunda metade do século e teria seu apogeu cerca de cem anos depois, entre 1730 e 1760. Era frequente a presença de baleias na baía de Guanabara, convertendo a capitania do Rio de Janeiro em importante núcleo baleeiro durante o período colonial. No entanto, com a intensificação do trânsito de embarcações, após a descoberta de metais preciosos em Minas Gerais, os animais migraram para fora da baía. Logo, uma nova armação (local em que a baleia era morta e destroçada) seria construída na região de Búzios, mais ao norte da cidade. Além do litoral fluminense, também Santa Catarina, Bahia e Ilha Bela (SP) desenvolveram a atividade. As chamadas fábricas ou engenhos de azeite integravam as armações e era o local onde a gordura era processada e, posteriormente, utilizada na iluminação de ruas, casas e engenhos. O negócio de pesca de baleias era muito lucrativo, produzindo diferentes subprodutos: o azeite era combustível e o que não fosse aproveitado na iluminação era utilizado no preparo de argamassa usada nas construções; as barbatanas eram matéria prima para fabricação de leques e espartilhos; a carne, para alimentação e os ossos, usados na feitura de botões. A pesca encontrou seu declínio no século XIX, com a introdução da iluminação a querosene, mas só foi proibida no Brasil nos anos 1980.

[3]INVASÕES FRANCESAS [AO RIO DE JANEIRO]: durante todo período colonial, registrou-se a presença de franceses ao longo da costa brasileira, fosse por meio da atividade corsária, incorrendo junto à população nativa o escambo do pau-brasil, ou através de tentativas de colonização de parte do território, como foi o caso do Rio de Janeiro e do Maranhão. A primeira investida para fundação de uma colônia francesa na Baía de Guanabara foi realizada, ainda, em 1555, quando a expedição comandada por Nicolas Durand de Villegagnon estabeleceu um núcleo de povoamento conhecido como França Antártica. A campanha de Estácio de Sá para a expulsão dos franceses se estendeu de 1660 a 1667, período em que foi fundada a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, a princípio num istmo entre o morro Cara de Cão e o morro do Pão de Açúcar e, posteriormente, transferida para o alto do morro do Castelo. No entanto, uma segunda invasão francesa ao Rio de Janeiro ocorreria em setembro de 1711, sob o comando do corsário francês René Duguay-Trouin. Liderando uma esquadra fortemente armada, conseguiu reparar a derrota sofrida por Jean François Duclerc, que tentara ocupar a cidade alguns meses antes. O Rio de Janeiro transformou-se em palco de acirradas batalhas, foi saqueado e teve várias de suas construções destruídas. Duguay-Trouin libertou parte da tripulação feita prisioneira durante a invasão comandada por Duclerc em 1710, assim como cripto-judeus que seriam enviados para a Inquisição em Portugal. Depois de pilhar a cidade e afastar a população para o interior, Duguay-Trouin exigiu o pagamento de um resgate sob pena de destruí-la. O governador Francisco de Castro Morais acabou permitindo que o corsário levasse todo o ouro e riqueza que conseguisse encontrar, tendo em vista que, na fuga para o interior, a população carregara consigo seus pertences de valor, tornando impossível arrecadar o resgate exigido. Parte do que os franceses conseguiram obter foram bens e produtos sequestrados, em parte revendidos aos próprios moradores da localidade, contribuindo para o sentimento de humilhação dos habitantes do Rio de Janeiro, em face de uma entrega tão fácil da cidade aos estrangeiros.

[4]CONTRATO: desde o século XV, a coroa portuguesa estabeleceu o sistema de monopólio para a exploração das riquezas em suas colônias, incidindo sobre produtos, portos, rotas. A imposição do “exclusivo colonial” se encontra na base da relação colônia/metrópole. No final deste mesmo século, como forma de aumentar sua renda para além da arrecadação de impostos e das várias taxas (alfândega, circulação de mercadoria), a Coroa passou a arrendar para terceiros, sob a forma de contratos, o direito de monopólio em determinadas atividades, aumentando assim sua liquidez, diminuindo os riscos da empreitada. Na colônia americana, os contratos do sal, pau-brasil, escravos e pesca da baleia integravam o sistema de monopólio real, e ofereciam aos contratadores a oportunidade de aumentar negócios e acumular riquezas. Os contratos tinham data para começar e terminar, e a sua assinatura também exibia um caráter político muito forte: apenas fidalgos bem relacionados poderiam arrematá-los, dependendo o sistema de um jogo de interesses e influências.

[5]PROVEDOR: o provedor era imbuído de especiais funções quanto à vigilância e observância dos estatutos gerais e públicos de uma instituição, à obediência aos decretos, alvarás, avisos e resoluções. No Brasil o cargo foi criado em 1548, por ocasião da instalação do governo-geral, tendo por objetivo cuidar dos assuntos relativos à administração fazendária. Existiram várias categorias de provedores, todos subordinados ao provedor-mor (mais alta instância administrativa, responsável pela arrecadação, contabilidade, fiscalização e convocação dos oficiais da Fazenda) e que atuaram em instâncias diferenciadas, entre as quais se podem mencionar a Alfândega, a Justiça, a Casa da Moeda, as Minas, Defuntos e Ausentes, entre outras. Nomeados pelo rei ou pelo governador-geral, os provedores eram responsáveis por acompanhar e administrar as rendas e direitos régios arrecadados, fiscalizar e registrar a movimentação comercial, cobrar os direitos, punir as irregularidades cometidas pelos oficiais de Fazenda, entre outras funções. Prestavam contas ao provedor-mor, inicialmente, e depois ao Conselho da Fazenda.

[6]RIO DE JANEIRO: a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro foi fundada tendo como marco de referência uma invasão francesa. Em 1555, a expedição do militar Nicolau Durand de Villegaignon conquista o local onde seria a cidade e cria a França Antártica. Os franceses, aliados aos índios tamoios confederados com outras tribos, foram expulsos em 1567 por Mem de Sá, cujas tropas foram comandadas por seu sobrinho Estácio de Sá, com o apoio dos índios termiminós, liderados por Arariboia. Foi Estácio que estabeleceu “oficialmente” a cidade e iniciou, de fato, a colonização portuguesa na região. O primeiro núcleo de ocupação foi o morro do Castelo, onde foram erguidos o Forte de São Sebastião, a Casa da Câmara e do governador, a cadeia, a primeira matriz e o colégio jesuíta. Ainda no século XVI, o povoamento se intensifica e, no governo de Salvador Correia de Sá, verifica-se um aumento da população no núcleo urbano, das lavouras de cana e dos engenhos de açúcar no entorno. No século seguinte, o açúcar se expande pelas baixadas que cercam a cidade, que cresce aos pés dos morros, ainda limitada por brejos e charcos. O comércio começa a crescer, sobretudo o de escravos africanos, nos trapiches instalados nos portos. O ouro que se descobre nas Minas Gerais do século XVIII representa um grande impulso ao crescimento da cidade. Seu porto ganha em volume de negócios e torna-se uma das principais entradas para o tráfico atlântico de escravos e o grande elo entre Portugal e o sertão, transportando gêneros e pessoas para as minas e ouro para a metrópole. É também neste século, que a cidade vive duas invasões de franceses, entre elas a do célebre Duguay Trouin, que arrasa a cidade e os moradores. Desde sua fundação, esta cidade e a capitania como um todo desempenharam papel central na defesa de toda a região sul da América portuguesa, fato demonstrado pela designação do governador do Rio de Janeiro Salvador de Sá como capitão-general das capitanias do Sul (mais vulneráveis por sua proximidade com as colônias espanholas), e pela transferência da sede do vice-reinado, em Salvador até 1763, para o Rio de Janeiro quando a parte sul da colônia tornou-se centro de produção aurífera e, portanto, dos interesses metropolitanos. Ao longo do setecentos, começam os trabalhos de melhoria urbana, principalmente no aumento da captação de água nos rios e construção de fontes e chafarizes para abastecimento da população. Um dos governos mais significativos deste século foi o de Gomes Freire de Andrada, que edificou conventos, chafarizes, e reformou o aqueduto da Carioca, entre outras obras importantes. Com a transferência da capital, a cidade cresce, se fortifica, abre ruas e tenta mudar de costumes. Um dos responsáveis por essas mudanças foi o marquês do Lavradio, cujo governo deu grande impulso às melhorias urbanas, voltando suas atenções para posturas de aumento da higiene e da salubridade, aterrando pântanos, calçando ruas, construindo matadouros, iluminando praças e logradouros, construindo o aqueduto com vistas a resolver o problema do abastecimento de água na cidade. Lavradio, cuja administração se dá no bojo do reformismo ilustrado português (assim como de seu sucessor Luís de Vasconcelos e Souza), ainda criou a Academia Científica do Rio de Janeiro. Foi também ele quem erigiu o mercado do Valongo e transferiu para lá o comércio de escravos africanos que se dava nas ruas da cidade. Importantíssimo negócio foi o tráfico de escravos trazidos em navios negreiros e vendidos aos fazendeiros e comerciantes, tornando-se um dos principais portos negreiros e de comércio do país. O comércio marítimo entre o Rio de Janeiro, Lisboa e os portos africanos de Guiné, Angola e Moçambique constituía a principal fonte de lucro da capitania. A cidade deu um novo salto de evolução urbana com a instalação, em 1808, da sede do Império português. A partir de então, o Rio de Janeiro passa por um processo de modernização, pautado por critérios urbanísticos europeus que incluíam novas posturas urbanas, alterações nos padrões de sociabilidade, seguindo o que se concebia como um esforço de civilização. Assume definitivamente o papel de cabeça do Império, posição que sustentou para além do retorno da Corte, como capital do Império do Brasil, já independente.

 

 

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